quarta-feira, 20 de julho de 2011

O Planeta Vermelho

 -Quem são eles meu Avô?
-Esses são os colorados, meu filho...
Atravessando o portão nas mãos de meu Avô, olhava atônito tudo aquilo, quase que não conseguindo entender o que se passava.
Eram fuscas,opalas,brasílias,todos cobertos com imensos mantos vermelho e branco. O povo gritava enlouquecidamente como se fossem guerreiros, índios peles vermelhas em um ritual de batalha:"Parecem aqueles mesmos índios dos seriados do Rin-tin-tin, sabe?É,aqueles que sempre lutam contra os soldados de fardas azuis ...lutam...lutam...mas sempre perdem...infelizmente".
Em uma família quase que na totalidade tricolor, era difícil de acreditar que do outro lado do portão existisse vida, ainda mais ilustrada em cores fortes e marcantes. A penumbra da noite em conjunção com aquelas bandeiras vermelhas, traziam um visual emocionante e demasiadamente cativante.
Sem conseguir conter minha felicidade, coloquei meus olhos cintilantes sobre meu Avô Tricolor.Por sua vez, sem precisar referir uma só palavra, ele fixou seus olhos em meu semblante maravilhado,colocou um sorriso em seu rosto e nem precisou dizer:"Vai meu filho, vai ser feliz..."
Era a comemoração do Bi-Campeonato de 76. No mesmo ano, a felicidade e a alegria vieram bater novamente em minha porta, quando embaixo da árvore de Natal, ao lado do presépio do Menino Jesus,estavam minhas primeiras vestimentas alvi-rubras, recém conferidas por meu Padrinho, um dos poucos colorados da família.
E o dia em que meu Pai, também tricolor, me levou para conhecer nosso Templo Sagrado? A minha emoção era incontida, nosso castelo era imensamente fantástico.Encostado no muro, com as pontas do pé,tentava enxergar o verde do gramado, tentava vislumbrar o cimento e o concreto das marquises,tudo era fenomenal para mim. Naquele mesmo dia, recebi de meu Pai, novas túnicas alvi-rubras,já com a nova estrela e o ramo verde do Tri-campeonato invicto,bordados vistosamente em nosso manto sagrado.
E quem diria que numa noite fria na terra do Sol nascente,o Planeta Vermelho chegaria ao seu ápice?Em um combate excessivamente disputado,nossos heróis vermelhos conseguiram uma vitória importante e enaltecedora sobre o tão poderoso Exército Catalão.Como se fossem arcanjos de uma ordem divina,trajando hábitos brancos e imaculados, nossos gladiadores se multiplicaram de uma forma inacreditável dentro do campo de batalha, deixando a retaguarda catalã atordoada,sem conseguir impor qualquer tipo de resistência. Naquele dia o imponente Exército Vermelho obteve a tão sonhada vitória,levando ao êxtase milhões de seguidores alvi-rubros espalhados por todo o Planeta Vermelho.
De novo, lá estava eu na calçada aguardando a passagem dos fiéis vermelhos.Quando o caminhão de bombeiros que trazia nossos heróis se aproximou,o meu coração parou.Naquele momento sublime,relembrei de várias festividades coloradas.Com lágrimas incontidas, levantei minha velha vestimenta das três estrelas, no mesmo instante em que nosso Querubim de Quixeramobim, erguia aos céus o símbolo de nossa conquista mundial.
Com o veículo bem próximo de mim,pude ver e ouvir nossos heróis entoando o Celeiro de Ases em uma felicidade jamais vista.Naquela hora, o calor era intenso,o sol reluzia em uma energia latente,coloquei meus olhos sobre o cenário festivo e vislumbrei que haviam muito mais arcanjos sobrevoando a cidade do que minha percepção poderia imaginar.Enquanto a multidão se afastava,visivelmente emocionado,sentei no cordão vermelho e branco da calçada e deixei que minhas lágrimas caissem sobre as iniciais entrelaçadas de nosso glorioso brasão.Em meio a entoação dos cânticos alvi-rubros, se ouvia quase que de uma forma imperceptível,vozes de mensageiros com hábitos alvi-rubros repetindo seguidamente uma mesma frase:"Este é o Planeta Vermelho...Vai colorado, vai ser feliz..."

Márcio Mór Giongo, em 21 de dezembro de 2006.

 
* Este texto foi publicado na Coletanea Fantasias, da Alpas XXI, pela Editora Alternativa, em 2011.

 







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