Era um singelo tijolo. Eram tantos outros tijolos. Eram cimentos. Eram argamassas. Eram concretos. Eram em abstrato, torcedores. Eram em realidade, operários. Eram, por certo, anônimos torcedores, incansáveis e dedicados operários - em suor, em sangue e em legítimas dores.
Emergiu das águas do rio. Como um espectro do além, se fortaleceu e criou raízes que beiram águas e sonhos. Das lágrimas de uma paixão desenfreada e das vozes de um amor encarnado, surgiu um templo sagrado.
Colheram-se flores, plantaram-se frutos. Doeu o corpo e também feriu a alma, os inapropriados e inconvenientes, espinhos sem nexo. Aqueles que não se endireitam! Machucam, cortam e corroem as veias do sangue rubro - as tristes, inexplicáveis e tão amarguradas derrotas!
Mas, com toda certeza, foram poucas! Desde a mais remota lembrança, de outrora: das pontas dos meus pés, para enxergar o gramado, por de trás do alambrado - até as mais recentes memórias: das arquibancadas pintadas em vermelho e branco, da magia contagiante da Guarda Popular e do reluzente e imponente placar eletrônico - as vitórias e as conquistas coloradas se sobressaíram!
Agora, estás Gigante em repouso! O sono dos justos! O descanso dos deuses!
A alma vermelha em redenção - a espera de mais vibrações, de mais alegrias, de mais vitórias, de mais conquistas!
Vejo em sua volta, um abraço em folhas enormes de paineiras; vejo lugares e assentos, bem alinhados e macios, que confortam com primazia, seu flamejante e fiel torcedor. Vejo mais! Vejo luzes e mais luzes! Vejo a alma rubra, mais e mais iluminada! Vejo em sua radiante atmosfera, doces arcanjos em voos rasantes! Vejo o espírito latente do Rolo Compressor, e os craques magistrais do velho e lendário Eucaliptos! Vejo Dom Elias, subindo e transcendendo em um brilhante raio de sol; cumprimentar o arqueiro rival, e comemorar o místico gol iluminado! Vejo Paulo Roberto Falcão, desfilar em passadas largas e marcantes, no resplandecer eterno, de um time que nunca e que jamais perdeu! Vejo Paulo César Tinga, se agachando, orando e cabeceando todo o seu esplendor, em direção ao topo mais alto da América! Ah, vejo Rafael Sóbis, com a suave pontinha de sua chuteira de rubi, abrir e indicar um caminho sutil, para a segunda e tão preciosa corrida à América!
Vejo, ainda, neste campo vital, de sonhos e devaneios: Dario, Claudião, Valdomiro e Claudiomiro! Vejo, também, Carpegiani, Mário Sérgio, Manga e Benitez! Vejo Taffarel, Dunga, Luis Carlos Winck e Guinazu! Vejo Maurício, Gérson, Renteria e Mauro Galvão! Vejo Ruben Paz, Pinga, Jair e Gato Fernandez! Vejo Escurinho, Lúcio, Christian e Diego Forlán! Vejo Librelato, Yarlei, Alexandre Pato e Nilmar! Vejo Fernandão, Índio, D'Alessandro e Oscar! Vejo Clemer, vejo Damião, vejo Fabiano, vejo Alex, Gamarra e o inesquecível e sempre idolatrado Gabiru!
Vejo e revejo alegrias, esqueço-me das tristezas! Vejo um Gigante renovado, um coração que pulsa e navega, ainda, sobre as águas densas de um generoso rio sulino. Uma alma que se eleva, sobre os cantos, as vozes e os gritos de um povo que enaltece, cada vez mais, a história e o mito de seus heróis - que pairam agora, sobre a leve brisa, das margens escuras do Rio Guaíba.
Dorme Gigante! Descansa e repousa, sereno e tranquilo - nos ombros de um guardião de águas infinitas e curadoras! E depois, quando o inescusável e inevitável destino, despertar: acorde, respire, ressurja, renasça e ressuscite - belo e impávido - ao amanhecer de uma aurora cintilante, em vistosas e glamorosas, cores alvirrubras!
Por Márcio Mór Giongo, em 5 de abril de 2013.