segunda-feira, 11 de março de 2013

Da Lama ao Sol

 
 
            Lembrei os campos amadores de minha saudosa infância. Ainda moleque, grudava meu queixo no alambrado, para assistir ao pequeno Juventude de Candelária, disputar o aguerrido, Campeonato Estadual Amador. A glória sublime para mim, era quando meu pai resolvia me acompanhar. Estacionava o antigo corcel, atrás de uma das goleiras do estádio, sim, naquela época isso era comum, e eu ficava sentado no banco, com o ouvido no rádio, muitas vezes na partida do Colorado, e com os olhos fixos nos jogadores da equipe amadora, que também, por coincidência, ou não, vestiam as mesmas cores branco e rubra.
           Domingos inesquecíveis aqueles, assistir ao jogo, com o nariz colado no alambrado é uma experiência por demais valiosa, que recomendo a quem queira se permitir. É diferente amigos, nestes campos pequenos, você consegue sentir e respirar toda a essência de um jogo de futebol. Em suas narinas, você sente e se delicia com o suave perfume da partida! Cá estou eu escrevendo, neste momento, e sentindo o agradável cheiro do gramado, ou o aroma, tão peculiar, do barro e da terra revirada, do singelo e modesto estádio do Juventude de Candelária.
           Com toda certeza, o treinador Dunga, quando pisou no gramado do Estadio 19 de Outubro, no último domingo, em Ijuí, também voltou a um passado bastante distante. A toda evidência, lembrou dos seus primeiros passos como atleta de futebol. Recordou de seus amigos, seus colegas, sua familia. Talvez tenha lembrado do segurança, do massagista, do vendedor ambulante. Talvez tenha sentido um cheiro de amendoim torrado no ar, ou um aroma de pipoca queimada. Ou simplesmente, lembrou o cheiro da grama verde, ou suspirou pelo aroma do barro e da terra vermelha, totalmente revirada, dentro do estádio local.
            E naquele instante em que Leandro Damião se antecipou a zaga adversária, e desferiu um petardo  indefensavel, no canto esquerdo do arqueiro do São Luiz, por algum momento, pensei que estava assistindo a mais uma vitória do glorioso Juventude de Candelária. Sim, a proximidade do gramado me levava a acreditar nisso. O campo totalmente enlamado me fazia crer que a decisão, a minhas vistas, era na verdade de um campeonato amador, em uma pequena cidade do Rio Grande do Sul.
            Gabriel, em um rebote dentro da pequena e conturbada área rival, efetuou com precisão o segundo tento rubro. Já o todo embarrado e enlamado, capitão D"alessandro, marcou com eximia categoria e tranquilidade, o terceiro gol colorado, na decisão do primeiro turno gaúcho.
             Mas, quando Leandro Damião disparou a pelota por cobertura, e ela beijou vistosamente, as redes adversárias; aos olhos de todo o estádio, quase corri para junto do alambrado, afim de comemorar o belíssimo gol, com o artilheiro rubro; que naquele momento, se pendurava sem cerimônia, na cerca de arame, que continha a torcida colorada!
             Rafael Moura, no apagar das luzes, com uma maestria fora do normal, anotou o quinto tento colorado, ainda abanou para mim, acenou para o vendedor de picolé que passava por ali e saudou com devoção o povo rubro, que se acomodou da forma que pode, nas pequenas e provisórias arquibancadas, disponiveis naquela tarde, no reduto do São Luiz de Ijuí.
              Foi um confronto à moda antiga. Quem viveu os anos setenta sabe do que estou dizendo. Chuva, sol, barro, lama, terra vermelha, alambrado, trava de chuteira, muro, arquibancada móvel e o título da Taça Piratini, mais uma vez nas mãos, desta feita por demais enlamadas, do capitão e maestro colorado, nesta tão merecida e epidérmica conquista.

            Ademais, minha caneta vermelha disse e assina ao povo rubro.

            Por Márcio Mór Giongo
           Foto: ClickRBS




terça-feira, 5 de março de 2013

Dois Tentos de Copa


 
              Sem dor, sem cansaço, sem freio, sem piedade; com os olhos em riste, com olhos na esfera, com olhos de fera, com olhos que pontuam em uma meta equidistante.
              Sem medo, sem receio, sem melancolia, sem apatia; com  pés quase descalços, com os pés amostra, com  pés que relevam, com pés que capricham em um doce enredo.
              Sem amarguras, sem tristezas, sem revés, sem dissabores; com dentes cerrados, com dentes de guerra, com dentes que desejam, com dentes que brilham em um próspero epílogo.
              Uma chuteira, a sombra de uma chuteira - a esfera, o vento de uma esfera - o adversário, o ímpeto de um adversário!
              Uma viagem orbital: a pelota em efeito, que ricocheteia e desliza em uma teimosia salutar -  perfura luvas tardias de um batalha inglória - e por derradeiro, beija o véu imaculado, que veste com primazia o arco da meta!
              Um suspiro, um alivio, um sorriso extasiante, um abraço gigante e rubro - uma festa vermelha!
              Um dia de glória, um entardecer repleto, uma alegria sem fim - em um coração que pulsa, agora, mais do que vibrante!
              Uma sinuosa corrida em destino ao céu, um duelo que acorrenta um lado da área, que bloqueia a outra face da mesma área...mas, na alforria  das pernas, em um leve e estiloso bailado...  há um petardo rasante - e a pelota que beija de novo o barbante!
              Dois tentos de Copa, dois tentos para a vitoria, dois tentos para o embate Piratini e a estrela cisplatina, enfim, mais do que cintilante, aos ollhos de todo o Planeta Vermelho.

              Ademais, minha caneta vermelha disse e assina ao povo rubro.

              Por Márcio Mór Giongo

              Foto: Terra Esportes