quarta-feira, 20 de julho de 2011

Libertadores

Mês de maio, noite fria e nebulosa, movimento diferente para aquele horário no pequeno vilarejo, na periferia da Capital.
Maicon, da fresta da cortina procura observar os acontecimentos. Seu cachorro ladra, seu filho de um ano e meio, acorda. E chora. Alguém bate na porta. Sem muita paciência bate de novo. Maicon abre. Sem poder ao menos suspirar, os policiais o algemam, desferindo-lhe uma coronhada na cabeça.
É acusado de ter assassinado um policial, em um assalto à banco. Um negro de camisa vermelha teria atirado em um policial.
Não era ele. Maicon trabalhava em uma oficina mecânica, bem próximo ao Banco que foi assaltado. Maicon tinha família, residência e talvez nem soubesse manusear uma arma de fogo. Seu único crime: ter nascido pobre, negro e estar naquele dia vestindo uma camisa vermelha de seu time do coração.
Após alguns dias na prisão, Maicon consegue a liberdade. O caminho de volta para casa é longo e demorado. As lembranças e as dores da prisão ficarão para sempre em sua memória. De carona com seu advogado, Maicon pede para parar na lancheria. Estava com fome. Queria matar a saudade do bauru do Seu Zé.
Na televisão, um jogo de futebol. Era o seu colorado em campo. A batalha era na Argentina contra o atual Campeão da América, o Estudiantes. Maicon, naquele momento, conseguia se alegrar. Depois da liberdade, um jogo de Libertadores.
Andrezinho domina a bola, o talentoso meia colorado, negro como tantos outros negros que envergaram a jaqueta colorada, em um toque genial, encontra o predestinado menino Giuliano, que com a perna direita empurra a pelota para as redes platinas. È o gol da classificação!!! Maicon vibra!!! Comemora!!!
Em meio a comemoração, ouve-se um ruído diferente. Maicon corre para fora do bar. “Doutor, o seu carro”!!! Tenta evitar o furto. Tenta em vão. Um novo estrondo! Maicon está caído...sua mão aperta seu coração...sobre o emblema rubro, sangue...muito sangue, seu corpo empalidece, a boca trêmula...Em um último suspiro, consegue, ainda, dizer: “É gol Doutor!!! É gol do Colorado!!!!


Márcio Mór Giongo, em 1 de agosto de 2010



* Este texto foi publicado na Coletanea Labirintos, da Alpas XXI, pela Editora Alternativa, em 2011.







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